final fantasy III

Final Fantasy III trintou!

Existem poucas histórias tão mal contadas quanto a de Final Fantasy III. Existem poucos personagens tão rasos quanto os protagonistas, vilões e personagens secundários que estão nesse jogo.

Mas eu amo todos eles. Eu amo esse jogo e sua história e seus temas profundamente. E eu vou falar de Final Fantasy III e da perspectiva que eu tenho sobre esse jogo e também da minha história com ele.

Eu sinto muito, esse artigo não vai ser tão interessante pro público como os meus anteriores foram, eu imagino. Aqui não vai ter nenhum dado relevante para a indústria de games como um todo. Também não terão tantas curiosidades assim, nem mesmo uma análise profunda sobre o jogo.

Eu tomei a liberdade de escrever esse artigo mesmo assim porque 2020 marcou o aniversário de 30 anos de lançamento desse jogo. E eu quero celebrá-lo, mesmo que sozinho. Então eu sequestrei um pouco o holofote que essa plataforma maravilhosa do Compass possui para trazer um pouco de amor por Final Fantasy III, já que eu sinto que ele não é tão conhecido, tampouco reconhecido, como ele poderia ser.

Arte oficial do nameless warrior para o jogo Final Fantasy III, por Yoshitaka Amano

Mas, espera! Antes de a gente fazer um mergulho mais profundo nesse jogo (eu juro que tem profundidade! É sério! Hahahahaha), trago aqui alguns fatos para gente se situar no tempo e espaço para assim podermos entender melhor o impacto, o legado e o que de fato aconteceu com Final Fantasy III.

No fatídico dia 27 de Abril de 1990, Final Fantasy III deu o ar da graça em território japonês e só saiu de lá oficialmente 16 anos depois – falarei mais sobre isso depois. – e, para a sua época, foi um dos JRPGs mais ambiciosos, levando ao máximo o poder de processamento e armazenamento do Famicom.

A recepção do jogo foi extremamente positiva pela mídia japonesa para a versão de 1990 e geralmente positiva pela mídia mundial para o seu remake de 2006, para Nintendo DS. Mas… ?

Então por que demorou tanto tempo para esse jogo sair do Japão e conhecer o mundo oficialmente?

Há uma resposta clara para isso. Final Fantasy III até foi planejado para um lançamento mundial, porém, o Super Famicon também seria lançado em 1990 e a Squaresoft na época simplesmente não tinha braço para trabalhar em cima do hardware novo e preparar um esforço de localização do jogo. De acordo com o Hiromichi Tanaka (SIM! O mesmo Hiromichi Tanaka da série Mana ! Não sabe quem ele é? Você pode ler o meu artigo falando sobre a minha história com a série Mana clicando aqui), quando o Super Famicom saiu, algumas barreiras tiveram que ser superadas tanto pela Square, quanto por outras desenvolvedoras, já que era a primeira vez que eles lidavam com um upgrade de hardware (o famoso “ir para próxima geração de consoles”), coisa que é extremamente normal hoje em dia… Tem muita coisa que a gente tem como garantido, né? Eu acho incrível essas histórias… Enfim, devido a esse esforço necessário para preparar a empresa para a próxima geração de consoles, não foi possível alocar recursos suficientes para a localização do jogo para o ocidente.

Ufa, quanta coisa! Bom… Agora que já temos o contexto necessário para entender o que aconteceu com o game, bora pra parte que realmente interessa; Vamos falar sobre Final Fantasy III e do porquê de eu achar esse jogo incrível (tanto o original quanto o seu remake)!

Eu vou ser o primeiro a admitir que Final Fantasy III não é um jogo com apelo muito amplo. E isso é perceptível a olhos vistos devido à própria estrutura do jogo. Ele é um JRPG antigo, com batalhas por turnos, dungeons densas e relativamente difíceis, chefes enjoados para derrotar e uma história que possui mais qualidades nos tons que ela traz e nas provocações que ela faz ao jogador do que no roteiro em si, do que em seu desenvolvimento. A música é maravilhosa, ao menos. Se você não conseguiu identificar a qualidade da trilha sonora de Final Fantasy III…. Meu amigo… Não sei o que te dizer a não ser “Vai ouvir Boundless Ocean de novo, ou qualquer outra música”.

Os heróis contemplam a torre de Syrcus em um momento de calmaria antes da tempestade. Arte oficial do remake de Final Fantasy III, por Yoshitaka Amano.

O legado desse jogo, através do aperfeiçoamento do Job System – sistema de classes e talentos onde os personagens podem desempenhar qualquer papel em uma equipe, trocando de classes entre eles – é sentido até hoje em JRPGs como Bravely Default e Final Fantasy Tactics e até mesmo em jogos de outros gêneros.

Se já não ficou claro pelos meus posts em mídias sociais ou nestes artigos para o Compass, esse sistema de classes é o que mais me atrai para o gênero de JRPG, eu simplesmente amo a customização e aparente liberdade que isso traz.

Mas não, meus brothers, não é só isso que faz Final Fantasy III ser especial para mim. De jeito nenhum. Ele é um jogo que oferece aos seus jogadores mais… Muito mais! 

Agora eu vou pedir licença para falar um pouco sobre a história do jogo em si. Eu sei… Vou dar spoilers bem leves de um jogo de 30 anos, mas eu sei que foram poucas as pessoas que acompanharam o jogo, portanto se você liga para spoiler. Eu recomendo você fortemente a jogar antes de terminar de ler este artigo, sério… Eu vou esperar vocês aqui pelas próximas 15 ou 20 horas necessárias para terminar o jogo. Eu juro que não vou sair daqui.

… Terminou Final Fantasy III? Não liga para spoilers leves de um jogo tão velho? Ok, então vamos continuar com essa conversa, ou melhor, vamos continuar com esse monólogo.

Os temas que a história aborda são uns dos pontos mais incríveis de Final Fantasy III e é o que faz com que ele seja tão querido por mim, meus brothers. Certamente o jogo é um produto de sua época, onde mesmo um JRPG possuía uma história pouco desenvolvida e para alguém se aprofundar nela era necessário ir atrás de material de apoio, conversar sobre com pessoas que jogaram o jogo – ou são gentis o suficiente para te ouvir falar sobre ele – e tirar as suas próprias conclusões com o que a história trás, já que a história do jogo não te dá elementos necessários de coesão. (obrigado Final Fantasy Ultimania ♥, obrigado amigos por aturarem eu falar tanto sobre Final Fantasy III ♥, obrigado Stefane pela paciência infinita de ouvir 10x a mesma coisa ♥).

A história de Final Fantasy III traz temas como equilíbrio, ressentimento, luto e heroísmo de uma maneira mais ou menos competente. Digo isso porque os temas claramente estão lá, mas simplesmente não são explorados o suficiente durante a jogatina.

A história de Noah e seus aprendizes – Doga, Unei e Xande – é com certeza a minha coisa preferida desse jogo e, talvez, de toda a série Final Fantasy. Não é a toa que estes três personagens figuram entre os meus personagens secundários favoritos de todos esses jogos.

O que me faz ter tanto carinho por essa história em particular que, diga-se de passagem, é tão pouco comentada devido à sua falta de profundidade no jogo, se dá exatamente pelos temas que ela aborda e eu vou falar um pouco sobre eles a seguir. E eu já falei sobre a música tema do Doga e da Unei? É boa demais, vocês deveriam ouvir

Toda a história que serve de pano de fundo para Final Fantasy III advém da interação entre o mago Noah e seus três aprendizes. Quando a luz se tornou forte demais no mundo a ponto de vazar para o lado da escuridão – um fenômeno conhecido como inundação de luz – ameaçando extingui-la por completo através das ações de uma civilização conhecida como os Antigos, o mago Noah usou suas últimas forças para pôr um fim a essa ameaça e fazer com que o mundo voltasse ao equilíbrio.

Em seu leito de morte, o mago deu um presente a cada discípulo, para que eles se tornassem responsáveis por manter o tênue balanceamento entre luz e escuridão no mundo, foram uns presentes dahora, então vamos a eles:

Para Doga, o mago Noah deixou vasto conhecimento sobre magia, o que fez com que as magias do aprendiz ficassem ainda mais poderosas. Foi possível para Doga, graças a esse presente, criar magias ao invés de apenas canalizar forças para utilizá-las.

Doga brabíssimo com as suas magias novas. Arte oficial do jogo Final Fantasy Airborne Brigade, por Monster Octopus

Para Unei foi concedido o poder sobre a terra dos sonhos e do subconsciente das pessoas, trazendo consigo um forte poder de sugestão e influência sobre os sonhos da população tanto do mundo da luz quanto do mundo da escuridão e a capacidade de entrar na terra dos sonhos quando ela quisesse.

Unei se deu bem também, não teve mais um dia de insônia sequer. Arte oficial de Final Fantasy Airborne Brigade, por Monster Octopus

Para Xande, o aprendiz preferido do mago Noah, o presente foi a mortalidade. Sim, um presente meio bosta se comparado aos demais. Ainda mais bosta quando a gente se dá conta que eles todos eram imortais quando isso aconteceu. 

O Xande ficou pistola, meus  brothers.

Sério.

Quer dizer… quem não ficaria pistola com uma pilantragem dessas? Eu ficaria pistola com toda certeza.

Momentos antes da desgraça acontecer. Arte oficial de Xande para o jogo Final Fantasy III, por Yoshitaka Amano.

A bem da verdade, analisando essa cena com uma perspectiva distante – sendo apenas um jogador acompanhando a história – eu entendo como isso foi um presente para ele. Muita gente com quem eu conversei sobre essa história vê isso de forma diferente. Noah foi cuzão ou não foi cuzão com o Xande ao ter dado o dom da mortalidade a ele? 

Os argumentos para ambos os pontos de vista são válidos. Talvez Noah quisesse que Xande vivesse uma vida normal, sem as algemas da imortalidade vinculada a um árduo trabalho. Talvez Noah devesse dar a opção de Xande escolher a mortalidade no momento que ele quisesse e apenas retirar sua imortalidade dessa maneira foi um erro. E é essa a magia que faz com que Final Fantasy III seja tão memorável pra mim e, consequentemente, o meu preferido. Na inabilidade de trazer todos os elementos necessários para o jogador seguir a história, o jogo nos convida a tirarmos nossas próprias conclusões com o pouco que ele nos oferece nesse sentido.

Quando você termina o jogo e consequentemente contempla o seu desfecho, há um convite tácito para os jogadores reviverem todos os momentos vividos durante essas horas que foram mais importante para eles e a ponderarem sobre esses acontecimentos, significando-os de maneiras diferentes de acordo com as conclusões que eles chegaram.

Claro, parte dos jogadores vão apenas achar uma bosta o último chefe ter aparecido “do nada” e ter roubado parte do brilho da história e simplesmente nunca mais jogar novamente o pensar sobre Final Fantasy III – isso acontece aos montes – porém esse tipo de jogador provavelmente nem está lendo esse artigo até aqui então vamos focar nos aspectos positivos do jogo. 

Questões sobre essa que levantamos anteriormente, sobre Noah e seus discípulos, a questão sobre a inundação de luz e a ciclicidade de eventos desse tipo  – dessa vez, durante a história oficial do jogo, com as forças da escuridão ameaçando sobrepujar a luz do mundo -, a questão sobre temer a própria mortalidade ao invés de usá-la como força motriz a produzir coisas positivas no mundo, a questão sobre equilíbrio (Aqui vale lembrar que não é um equilíbrio entre bem e mal… Este equilíbrio entre a escuridão e a luz em final fantasy III é uma alegoria sobre opostos necessários para a sustentação de uma vida e não é sobre uma luta do bem contra o mal, nunca foi sobre isso.) a questão sobre sacrifício a uma causa maior, a questão do pesar que os protagonistas sentem a cada despedida, a questão das decisões tomadas pelo Doga e pela Unei…

Ok, vamos falar agora do Doga e da Unei, porque eles provavelmente são meus personagens secundários favoritos de toda a série Final Fantasy. Eles são dois velhos muito parças que receberam uma responsabilidade enorme de seu mestre e se tornaram, mais ou menos, os responsáveis por manter as coisas em ordem no mundo.

Eu acredito que eles não tenham pedido isso, mas aceitaram o fardo mesmo assim e eu só posso imaginar a fortitude e a força mental necessária para um imortal não sucumbir ao tédio e toda a tristeza que vem ao ser obrigado a viver todos os eventos do mundo e ver tantas pessoas queridas partirem sem ter outra opção a não ser viver, ainda mais com o fardo carregado pelos dois.

Sim, os quatro guerreiros da luz conseguem derrotá-los (mesmo eles sendo imortais… É…. É meio várzea isso hahaha), mas para quem vivenciou essa cena no jogo, seja no remake, seja no original, percebe que antes da batalha contra ambos, os protagonistas expressam um profundo pesar, porque mano… Os caras eram muito parças e eles se sacrificaram por uma causa maior até mesmo que suas responsabilidades com o mundo.

Unei jovenzinha com seu papagaio que deve ter 1 bilhão de anos. Arte oficial para o jogo Final Fantasy III, por Yoshitaka Amano.

Ok, talvez tenha me estendido um pouco falando sobre esses personagens, mas é o que acontece comigo. Quando eu realmente gosto de algo, seja uma história ou um produto ou um acontecimento em nossas vidas ou qualquer outra coisa, é difícil eu parar de falar sobre isso. Eu falo e falo e falo e falo até eu sentir que consegui transmitir a positividade que aquilo traz na minha vida. E isso acontece comigo quando eu falo sobre Final Fantasy III, eu nunca sinto que consigo fazer justiça ao que esse jogo significa para mim.

Quando eu jogo um JRPG ou um jogo de estratégia onde os personagens possuem classes intercambiáveis e que sejam altamente customizáveis eu penso em Final Fantasy III. Sem esse jogo provavelmente nunca teríamos jogos que utilizam esse sistema de caracterização que eu tanto amo nesses moldes que me agradam tanto. 

Quando eu jogo Final Fantasy V, eu me lembro de Final Fantasy III. Quando eu estou customizando meus personagens de Final Fantasy VI através das Magicites, eu penso em Final Fantasy III. Quando eu seleciono quais matérias dar para quais personagens em Final Fantasy VII, eu penso em Final Fantasy III. Quando eu jogo Final Fantasy Tactics eu penso em Final Fantasy III. Quando eu jogo a série Bravely Default idem. Quando eu jogo Octopath Traveller também. 

30 anos depois e o que mudou?

Há pouco mais de 30 anos esse jogo foi lançado e mudou tudo para mim no que diz respeito a JRPGs. Ele trouxe o meu sistema de customização preferido e uma história que, apesar de mal executada, reverbera em mim através dos temas abordados e que se mantém viva em mim por conta das discussões geradas em torno dos pontos centrais que ela apresenta.

O impacto de Final Fantasy III tende a passar despercebido próximo aos gigantes do gênero – inclusive dentro do próprio guarda-chuva da marca Final Fantasy – e tá tudo bem. Não espero que a indústria morra de amores pelo jogo ou que ele sempre apareça em listas de melhores jogos de todos os tempos – não acho que isso é necessário ou sequer pertinente -, mas Final Fantasy III sempre vai figurar o topo da minha lista de jogos da série Final Fantasy preferidos. Seja pelos seus personagens, seja pela sua história, seja pela sua trilha sonora maravilhosa, seja pelo seu sistema de classes intercambiáveis, seja pelos temas abordados no jogo.

Então… feliz 30 anos, Final Fantasy III. Obrigado por tudo isso que você me proporcionou e que a sua influência continue possibilitando novos jogos incríveis. Eu vou continuar comemorando os seus próximos 30, 60, 90 anos, mesmo quando a sua influência na indústria transforme-se em pó pela passagem do tempo.

Não é uma questão de paralisar o tempo para que o impacto de Final Fantasy III continue relevante para sempre. Nunca foi. Esse artigo – assim como o tema de Final Fantasy III – também é sobre aproveitar o tempo que nos é dado e devolver o nosso melhor para o mundo, independente do que o mundo nos dá, por mais difícil que isso possa parecer. Espero que consigamos encontrar o equilíbrio entre todas as coisas das nossas vidas e que isso se converta em coisas boas para o nosso mundo.

Obrigado para quem leu até aqui, espero ter conseguido manter sua atenção o suficiente enquanto eu falava sobre essas minhas coisas. Eu acho que finalmente posso sossegar em relação a falar sobre Final Fantasy III, afinal…

Arte oficial dos protagonistas do remake de Final Fantasy III, por Akihiko Yoshida
José "Quinho" Lisboa

José "Quinho" Lisboa

Quando não está passando pela síndrome do Tetris, está analisando gráficos, dados e números sobre o mercado de games... Antigamente para xingar muito no twitter, agora para atuar profissionalmente.

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