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Terminologia corretas para pessoas com deficiência – Especial pessoas surdas

Não muito tempo atrás, fui à farmácia comprar remédio, quando ao entrar, sou recebida por um dos atendentes sinalizando “bom dia” em Língua Brasileira de Sinais (Libras). Logo em seguida ele continuou o atendimento em Português. 

Como uma pessoa que fez a disciplina de Libras por um semestre na faculdade, eu fui capaz de que se tratava da língua e também me identifiquei com o jeito nervoso de sinalizar, bem claro de uma pessoa que está tendo primeiro contato com a mesma e deseja praticar em todos os lugares para não esquecer o que aprendeu.

Ainda vi aquele atendente por algumas semanas, mas depois não o vi mais durante um bom tempo, até que o reencontrei numa ida à farmácia antes do trabalho. Ao revê-lo, e agora como uma estudante de um curso básico de 1 ano de Libras, resolvi cumprimenta-lo sinalizando “bom dia”, então engatamos em uma mini conversa em que ele começou dizendo “já imaginou ser atendido por um surdo-mudo?. 

Ao ouvir a menção ao termo “surdo-mudo” logo minha animação diminuiu um pouco e comecei a ter várias dúvidas sobre em que lugar ele estaria aprendendo Libras e que não haviam ensinado a ele sobre a terminologia correta para se referir à pessoas surdas. 

Em contextos de proximidade com quem eu esteja conversando, sou bem ávida em explicar a terminologia correta para esse caso, mas nesse cenário de conversa, onde não havia nenhuma proximidade, me senti acuada em explicar e gerar um desconforto geral. Só não disse nada. Mas fiquei repensando essa situação ao longo do dia, até acordar e perceber que deveria escrever esse texto para de certa forma me redimir por não ter sido um agente de mudança para alguém.

Se você é alguém que também usa o termo “surdo-mudo” para se referir às pessoas surdas, você deve estar se perguntando, mas é errado? Por que todo esse textão sobre o assunto? 

A verdade é que é errado sim e vou te explicar o por que. 

As pessoas surdas, durante muitos anos, sofreram (e ainda sofrem) com a falta de informação da sociedade em geral. A Língua Brasileira de Sinais só foi reconhecida como língua do país em 24 de abril de 2002, através da Lei nº 10.436. E, durante muito tempo, os surdos tiveram que lutar pelo direito de poder usar sua língua materna para se comunicar. Sendo obrigados a aprenderem português e a se comunicar através de uma língua oral, tendo sua própria língua sendo tratada como algo ruim e proibido. 

Para evitar que essa falta de informação continue fazendo vítimas é importante entender e evitar certos termos que podem incentivar a transmissão de conceitos errados. Pessoas surdas NÃO são obrigatoriamente mudas. Tem-se que separar esses dois conceitos. 

Pessoas surdas são aquelas que têm alguma condição que afeta o sentido da audição. Podendo, inclusive, não serem surdas totais, ou podendo se utilizarem de aparelhos auditivos e implantes que os auxiliam na audição, assim como óculos podem auxiliar algumas situações que afetam o sentido da visão. 

Se surdos não falam ou emitem sons que para os ouvintes podem soar estranhos, é preciso entender o tipo de surdez daquela pessoa e também o seu ambiente e cultura, mas isso não implica necessariamente que ele também é mudo ou que não possa falar ou emitir sons. Na grande maioria dos casos, o sistema responsável pela fala está intacto, então não há impeditivo para essa pessoa falar, gritar, etc. 

Então não, um surdo não é obrigatoriamente mudo. Então não, não chame um surdo de surdo-mudo.

Ah, Loana, mas então chamo de que? Ah, Loana, mas por que ele não fala “normalmente”? 

Primeiro, vamos abolir o uso dessa palavra “normal” no contexto de pessoas com deficiência. Em pleno 2022, é importante que nós sejamos capazes de entender que o meu normal não é o seu normal e que ser normal é plural. Então o jeito que o surdo se expressar, seja unicamente por língua sinalizada, seja emitindo sons que não são necessariamente palavras do português ou mesmo que seja português, mas com um “sotaque” particular, tudo isso é também normal. 

E sobre o falar ou não português ou qualquer língua oral, como o inglês, italiano, espanhol, etc., pode sim ser uma escolha da pessoa surda. É preciso entender que há toda uma cultura que envolve a comunidade e povo surdo. Assim como fatores diversos que influenciam na escolha pessoal dela. 

A surdez faz parte de um espectro, onde é possível ir de uma leve perda auditiva até a surdez completa. Algumas possíveis de serem modificadas pelo uso de aparelhos e implantes, outras não. E o ambiente onde essa pessoa está inserida e a sua cultura também modificam a sua escolha. Ela pode escolher trabalhar sua identidade como pessoa surda não usando aparelhos e apenas sinalizando em língua de sinais, assim como ela pode escolher usar o português para se comunicar com outros falantes da língua portuguesa. É uma escolha que cabe apenas ao próprio indivíduo e deve ser respeitada. 

Outro ponto relevante a ser abordado, é a questão da dificuldade que a pessoa surda pode encontrar para aprender o português. A depender do grau de surdez dessa pessoa, a Libras será uma língua muito mais natural de ser aprendida como primeira língua e a língua que irá balizar toda a aquisição de linguagem dessa pessoa. Como assim, Loana? 

Como pessoa ouvinte, que tem o português como primeira língua (ou língua mãe), sempre que desejo aprender um novo idioma, todo o meu sistema de códigos para entender e interpretar esse novo idioma, se baseia no meu conhecimento inicial adquirido em português. Se ao ouvir a palavra apple sou capaz de visualizar uma fruta, de cor vermelha, formato específico que não é nenhuma outra que não uma maçã, é por que tive o primeiro aprendizado do que é uma maçã, através do português. 

Como uma pessoa ouvinte, nunca tive nenhuma dificuldade em absorver e receber a mensagem que vinha na língua oral portuguesa e, aos poucos, fui associando aquele código com algum significado, me permitindo compreender o sistema geral e assim interpretar mensagens que me eram passadas (puro suco de semiótica aqui, espero que não fique muito confuso). 

Mas uma pessoa surda, pode encontrar uma enorme dificuldade em receber a mensagem caso ela venha de forma sonora. É muito difícil aprender o som de algo, se não sou capaz de ouvir sons. É muito difícil entender como se pronuncia uma palavra que não posso ouvir como soa. Mas, como pessoa surda, ela pode ser extremamente visual e ter uma enorme facilidade de perceber e identificar os códigos de uma língua sinalizada. Na verdade, os surdos têm uma percepção visual muito melhor do que a de pessoas ouvintes. E pessoas ouvintes que sinalizam, tem uma percepção visual melhor do que pessoas ouvintes que não sabem uma língua de sinais, louco não? Nosso corpo é fantástico.

Então é muito importante respeitar essa fisiologia natural e a necessidade desse indivíduo. No final das contas, a palavra chave para tratar toda pessoa com deficiência é respeito! Sem esquecer também de ter curiosidade natural e empatia para entender esse indivíduo. Obviamente que você não vai lá ficar enchendo a pessoa de pergunta sobre a vida e o motivo das escolhas dela, mas procure entender mais sobre a cultura dela, sobre seu entorno. Hoje em dia existem diversas pessoas com deficiência que falam sobre seu cotidiano e sua cultura na internet. Seja no youtube, instagram, tik tok etc. Consuma o conteúdo delas e aprenda mais e mais como conviver nessa sociedade plural que é o mundo. 🙂 

Aqui vai uma referência oficial de Terminologia sobre Deficiência (Texto da Câmara dos Deputados): https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/gestao-na-camara-dos-deputados/responsabilidade-social-e-ambiental/acessibilidade/glossarios/terminologia-sobre-deficiencia-na-era-da-inclusao 

Referência de youtuber surdos: Léo Viturino, Gabriel Isaac do Isflocos e, para aprender Libras, recomendo o Sinais Diários de Libras.

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